Licença não remunerada é uma opção segura diante da pandemia do COVID-19?

Em recente notícia publicada pela Folha de São Paulo, divulgou-se o estado preocupante em que o Brasil se encontra: após quase três semanas do primeiro diagnóstico do COVID-19, já atingimos mais de 500 casos confirmados, enquanto a Itália – exemplo crítico -, a partir do 20º dia, contava com 155 casos confirmados, chegando aos assustadores números de mais de 31 mil pessoas infectadas e de 2600 óbitos nos dias de hoje.
O contexto social é de profundo pesar, sobretudo comparando-se com a experiência vivida pelos italianos. Diante desta dura realidade da pandemia, será que os empregadores possuem segurança jurídica para concessão de licença não remunerada aos seus empregados como forma de estabilizar o impacto financeiro causado?
Na atual conjuntura, e com todo o respeito à situação causada pela disseminação do COVID-19, a resposta ainda seria negativa, segundo os dispositivos legais e princípios que regem a matéria.
Bem sabido que as relações de emprego são ditadas sob o princípio básico de que o empregador é quem assume o risco do negócio quando admite pessoas para lhe prestarem serviços. Ou seja, transferir as dificuldades econômicas, de mercado, sociais e de saúde aos empregados com a concessão de licença não remunerada, a rigor, seria no mínimo arriscado.
A partir do momento em que o dono do negócio se propõe a prestar serviços contratando empregados e lhes garantindo o salário como contrapartida, as variantes do mercado não deveriam ser experimentadas e sofridas diretamente pelos últimos com a supressão de direito constitucionalmente assegurado como o salário.
Além do mais, a situação trazida pelo COVID-19 não representa uma das hipóteses legais tratadas no art. 476 da CLT para concessão da licença não remunerada (como seria o caso, por exemplo, dos afastamentos previdenciários por doença), bem como a Lei de nº 13979/2020 cuidou de garantir expressamente que situações de isolamento e quarentena resultantes de suspeita ou confirmação do vírus serão tratadas como faltas justificadas (sem prejuízo à remuneração), não cabendo ao empregador dar tratamento distinto por sua liberalidade.
Entendimento diverso, portanto, contrariaria a própria ideia de empregar trazida pela nossa legislação (art. 2º da CLT), trazendo consigo duas consequências drásticas e imediatas aos dois polos envolvidos na relação.
A primeira, aos empregados, de ordem financeira, dada a absoluta ausência de recursos mínimos capazes de garantir a subsistência familiar e muito menos de atuar como agente ativo de consumo em nível social.
A segunda, aos empregadores, pois a adoção de medida extrema como esta, implicaria na alimentação de um passivo trabalhista indesejável, seja porque é o protagonista do risco do negócio, seja porque é fato notório o aumento de demandas judiciais trabalhistas em tempos de crise na tentativa de minimizar os efeitos da escassez de recursos.
Por outro lado, a realidade nua e crua nos mostra que se “cochilou o cachimbo cai”, e, por isso, medidas precisam ser tomadas, talvez não tão radicais, especialmente para que não tenhamos mais falidos do que falecidos ao final deste estágio, com o perdão da triste (mas real) ironia.
Partindo desta linha, a prática de medidas de gestão como a compensação via banco de horas eliminando-se o saldo positivo, antecipação das férias (individuais ou coletivas), ainda que suprimido o prazo mínimo de 30 dias de comunicação formal, a adoção do regime de teletrabalho ou home office, além de redução salarial e de jornada via da negociação coletiva (artigo 611-A, §3º da CLT), mostram-se mais assertivas à necessidade de afastamento social, assim como propiciam segurança jurídica do empregador na tomada de decisão e quanto aos seus efeitos na “Era Pós-Corona Vírus”.
Ainda, como alternativa viável, a vivência no estado de “força maior” pelos empregadores, assim considerado como o acontecimento inevitável em relação à sua vontade, praticado por terceiro e que afeta a saúde financeira da empresa, é permitida por disposição literal de lei a redução geral dos salários dos empregados até 25%, devendo ser respeitado o salário mínimo regional apenas. Não fosse o bastante, caracterizada a “força maior” que exija a extinção do estabelecimento empresarial, será assegurado ao empregado apenas metade da indenização rescisória a que teria direito em caso de dispensa imotivada.
O que se percebe, por conseguinte, é que a concessão de licença não remunerada aos empregados na atual conjuntura não se mostra a opção mais apropriada aos empregadores para garantir o distanciamento social necessário para a contenção da pandemia e, simultaneamente, garantir minimamente a sustentabilidade dos seus negócios em tempos escuros.
A recomendação que fica, pois, seria no sentido de avaliar das alternativas já regulamentadas pela nossa legislação e acima descritas, qual seria a que melhor se encaixa em cada modelo de negócio, a fim de evitar não só a disseminação do inimigo invisível a todos nós, como também servir como instrumento hábil a preservar as finanças a curto, médio e longo prazo sem a insegurança de criar um passivo trabalhista tão assustador quanto o próprio COVID-19.
Autor: Bruno Michel Capetti é advogado trabalhista do Marins Bertoldi Advogados.

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